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Novo método vai rastrear processo do carvão vegetal

João Augusti, da Fibria: "Erramos muito no passado, definindo o que fazer do alto de um prédio na Alameda Santos"

Devastação ambiental, trabalho em condição análoga à de escravidão, conflitos sociais e ilegalidade são questões comumente associadas à cadeia produtiva do carvão, feito em geral com madeira de árvore nativa, em carvoarias clandestinas, e depois fornecido às siderúrgicas que o misturam ao minério de ferro e o transformam em ferro-gusa, matéria-prima do aço. O esforço conjunto dos ambientalistas, empresas, setor público e sociedade civil pretende mudar essa dura realidade.

Uma luz surgiu este mês, em Campo Grande (MS), durante o seminário sobre integração de práticas florestais, promovido pela ONG WWF Brasil, e que reuniu especialistas em florestas e produtores de carvão vegetal, aço, papel e celulose de 15 países. Durante o evento, três empresas do setor mínero-siderúrgico – Vetorial, Simasul e Sidepar – assinaram um documento simbólico comprometendo-se a aderir a um novo sistema de verificação que atesta as boas práticas no processo de produção de carvão.

O recém-lançado ProMoVe Carvão Vegetal é uma nova metodologia para rastrear e certificar a origem da madeira utilizada na produção de carvão e de todo o processo produtivo, até a entrega às siderúrgicas. Ela é resultado das discussões de um grupo de trabalho do qual participam, desde 2010, empresas, sociedade civil, setor público, Ministério Público, Fundação Avina, Instituto Ethos e WWF, e cujo objetivo era transformar uma atividade insustentável do ponto de vista ecológico numa ambiental e socialmente correta. “Estamos convencidos de que este é um momento histórico para o setor siderúrgico brasileiro”, disse durante o evento Caio Magri, gerente executivo de políticas públicas do Instituto Ethos.

Entusiasmado, ele dividiu a produção de carvão vegetal brasileira em antes e depois do ProMoVe. No período “antes” ele incluiu as ocorrências de fraudes, trabalho infantil e degradação ambiental; para o “depois”, ele previu transparência, rastreabilidade de toda a cadeia, trabalho decente nas carvoarias e uma commodity hoje totalmente improvável: o aço verde.

De acordo com o Ibama, em 2005, havia 5 mil carvoarias atuando no Estado do Mato Grosso do Sul. Destas, apenas 468 estavam legalizadas. Segundo o relatório da Operação Rastro Negro promovida pelo instituto, dos 10 milhões de metros de carvão transportados no Brasil em 2007, 44% eram oriundos do Mato Grosso do Sul.

A empresa que assinar o ProMoVe Carvão Vegetal – que na prática funciona como uma certificação ambiental, embora ainda não o seja – se compromete a implantar seis princípios que vão reger sua atividade: cumprimento do escopo legal; condições de trabalho decente, segundo as convenções da Organização Internacional do Trabalho; relação responsável com as comunidades próximas; responsabilidade ambiental (controle de impacto, redução de emissões); boas práticas de produção florestal, tecnologias eficientes e rastreabilidade.

Todas essas mudanças serão feitas por módulos, que levam, no total, cerca de oito anos, e passam por auditorias ao longo do processo. Segundo Leonardo Sobral, gerente de certificação florestal da Imaflora, o custo dessas adequações dependerá do nível de correção ambiental de cada empresa. “Sabemos que o custo é alto e a proposta é justamente de uma implementação gradual para diluir esses custos.”

Para Gustavo Corrêa, diretor presidente da Vetorial – maior empresa do setor siderúrgico no Mato Grosso do Sul e uma das signatárias do ProMoVe, os investimentos necessários hoje estão mais concentrados no campo do que na parte industrial. “Não sabemos o custo que isso terá, mas acredito que será alto e que terá de ser sustentado pelo mercado.”

Ele quer dizer que o ferro-gusa e o aço fabricados nessas condições ideais teriam que receber um prêmio sobre seu valor. Para Correa, o risco do novo sistema é o de não alcançar um número grande de participantes, o que penalizaria quem aderiu a ele com custos mais elevados e sem uma contrapartida no preço final.

A Vetorial produz anualmente 700 mil toneladas de ferro-gusa com carvão vegetal feito a partir de 70 mil hectares de florestas plantadas de eucalipto nas cidades de Corumbá, Campo Grande e Ribas do Rio Pardo. Em 2013 a empresa faturou R$ 500 milhoes e deve chegar a R$ 600 milhoes este ano.

O seminário sobre integração das práticas florestais fez parte de um “study tour” promovido pelo WWF para divulgar a chamada Plataforma NGP – New Generation Plantations, ou, plantações de uma nova geração. Segundo Luís Neves Silva, gerente da NGP, essa plataforma internacional busca promover novas maneiras de explorar as florestas, atendendo à demanda crescente por bens de consumo sem contudo destruir as matas nativas para tanto. Fazem parte dessa iniciativa dez empresas globais que cultivam florestas, entre elas a Fibria, Veracel e Suzano, três departamentos de Estado (Estado do Acre, administração florestal da China e do Reino Unido) e técnicos do mundo todo que se reúnem para compartilhar conhecimento. “Discutimos, por exemplo, como plantar de um jeito sustentável o eucalipto e o pinus, no Brasil, o bambu, na China, e a palma, na Malásia”, disse Neves.

Plantar de um jeito sustentável, para a NGP, significa considerar as necessidades das comunidades vizinhas e integrar outras culturas à monocultura que costuma se formar nas grandes áreas de florestas plantadas.

Segundo João Augusti, gerente de meio ambiente florestal da Fibria, a empresa teve de aprender a maneira adequada de se aproximar das comunidades do entorno nas áreas de cultivo de eucalipto no MS até convencê-las de que tinha uma boa proposta de trabalho conjunto. “Erramos muito no passado, definindo o que fazer do alto de um prédio na Alameda Santos, em São Paulo”, afirmou.

Para atrair essas comunidades para projetos agroflorestais sustentáveis, a empresa criou o Programa de Desenvolvimento Rural Territorial (PDRT), que capacita e oferece assistência técnica aos agricultores, fornece maquinário e informação sobre políticas públicas de interesse. No MS, já beneficia 610 famílias em sete comunidades. No Brasil, são 1.146 famílias em 40 comunidades. A renda média mensal das famílias envolvidas no PDRT subiu 44% de 2012 para 2013 na Bahia e no Espírito Santo, para R$ 1.155, e 24% no Mato Grosso do Sul, para R$ 2.100.

Benedito Ribeiro do Campos é um dos produtores engajados no PDRT. Ele mora no assentamento Esperança, em Brasilândia, a três horas de Campo Grande. Trata-se de uma fazenda de 175 hectares que foi dividida entre 32 famílias em 2008. Ali, produzem urucum e pecuária leiteira. “Quando eles chegaram para conversar, ficamos com o pé atrás”, disse Campos, sobre a tentativa de aproximação da Fibria, em 2009. Das 32 famílias, apenas 15 quiseram entrar no programa inicialmente.

Os técnicos da empresa forneceram madeira para erguer cercas e separar o gado, e ferramentas para recuperar o pasto, que estava muito deteriorado. Apenas com essas melhorias, a produtividade diária subiu de 30 litros para 65 litros por sítio. A Fibria também permitiu que o gado entrasse para pastar nas fileiras dos eucaliptos, o que gerou uma economia de R$ 250 por mês em aluguel de pasto para os produtores. “Não é assistencialismo, pois o programa tem prazo para acabar, cinco anos. Mas hoje já faz parte do plano de desenvolvimento da Fibria incluir as comunidades”, disse Augusti.

“A empresa também ganha com isso, porque o produtor se torna um guardião do território, inibindo roubo de madeira e incêndios”, explicou José Márcio Bizon, gerente de operações florestais da empresa.

Apenas na região de Três Lagoas, a Fibria tem 340 mil hectares de florestas de eucalipto, produzindo 5 milhões de toneladas de celulose. A empresa investiu até o momento na região R$ 6 milhões em 17 projetos socioambientais. Ao todo, a companhia investiu em 2013 R$ 31,6 milhões em projetos sociais, 16% acima de 2012.

Por: Marília de Camargo Cesar Fonte: Valor Econômico A jornalista viajou a convite da Fibria

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