Uma mistura explosiva de receitas em queda livre com custos e despesas em disparada levaram o Estaleiro Atlântico Sul (EAS) a um prejuízo de R$ 1,47 bilhão em 2011.
As demonstrações financeiras divulgadas ontem mostram que as receitas consolidadas da construção naval caíram pela metade, de R$ 1,09 bilhão em 2010 para R$ 504,4 milhões no ano passado.
Os custos de produção foram na direção contrária, em alta de 62%, para R$ 1,42 bilhão – ou seja, a receita não cobriu sequer os gastos com materiais e mão de obra.
Os aumentos das despesas operacionais, de 66%, e das financeiras líquidas, de 156%, completaram o estrago.
Nesse cenário, a empresa, controlada meio a meio pela Camargo Corrêa Naval Participações e pela Construtora Queiroz Galvão, não conseguiu cumprir índice de cobertura do serviço da dívida com o BNDES e o Banco do Brasil.
Segundo informações do balanço, a empresa obteve perdão do BNDES em 26 de dezembro. “No caso do Banco do Brasil, o contrato de financiamento prevê que em caso de descumprimento os acionistas podem ser requeridos a apresentar garantias”, diz a nota do balanço.
Uma pessoa com conhecimento da contabilidade da companhia, que preferiu não ser identificada, disse que o estaleiro tem uma carteira de R$ 12,5 bilhões em contratos para construir 22 petroleiros para a Transpetro e sete sondas de perfuração encomendadas pela Sete Brasil, que vai alugar esses equipamentos para a Petrobras.
A lista de problemas do EAS confunde-se com o renascimento da indústria brasileira de construção naval. O primeiro navio construído, o emblemático João Cândido – batizado pelo ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva com grande estardalhaço -, foi lançado ao mar com problemas.
Camargo Corrêa e Queiroz Galvão compraram, em março, a participação da Samsung (6%) no estaleiro e agora negociam às pressas com os japoneses a entrada de um consórcio formado por IHI (ex-Ishikawajima) e Mitsui, com a Mitsubishi correndo por fora.
No balanço, a EAS informa que “enfrentou dificuldades técnicas e operacionais, incluindo o superdimensionamento e a falta de mão de obra qualificada para concluir o navio João Cândido e a plataforma P-55”.
Essas dificuldades acarretaram diversos problemas, entre eles o atraso na construção dos navios e da plataforma. Também obrigaram o estaleiro a fazer uma “revisão e consequente redução das margens de lucratividade de parte dos projetos de construção dos navios; assim como necessidade de aporte financeiro dos acionistas para manter suas operações”.
Procurados, tanto o EAS quanto os sócios informaram que não iriam comentar o balanço.
Entre as principais causas do prejuízo, segundo a fonte, está a decisão de iniciar a construção do João Cândido e do casco da P-55 antes do estaleiro ficar pronto, o que prejudicou drasticamente a produtividade.
O atraso na entrega dos dois guindastes que, juntos, são capazes de içar 2,7 mil toneladas de carga, também foi crucial. O primeiro chegou em 2009 e o segundo, apenas no ano passado.
Sem eles, o estaleiro não pôde colocar em prática o seu conceito de acabamento avançado, que permite a produção de 30 megablocos fora do dique, o que aumentaria a produtividade e facilitaria o trabalho dos funcionários.
A alternativa foi fazer primeiro o casco e depois a montagem das outras partes (o recheio), com os funcionários tendo que entrar dentro da embarcação. As condições de trabalho eram adversas. À temperatura ambiente de aproximadamente 40º se somava o aquecimento provocado pelos equipamentos de solda e iluminação artificial. E os trabalhos que demorariam perto de uma hora em terra, levavam 8 horas por causa das paradas e do deslocamento dos funcionários.
A especialização da mão de obra foi outro revés, já que foi necessário treinar entre cinco mil e seis mil soldadores que antes trabalhavam em canaviais. O acordo com o Estado não permitia contratar fora de Pernambuco.
Por: Cláudia Schüffner e Nelson Niero
Fonte: Valor Econômico
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