Como garantir que a carne que chega até ao consumidor tenha sua origem atestada? Que não tenha feito uso de mão de obra escrava, que respeitou exigências sanitárias e ambientais? Como estimular o produtor a tornar esse processo transparente e participativo? Essas e muitas outras perguntas motivaram o encontro de representantes do setor produtivo, varejo, sociedade civil, pesquisadores e instituições financeiras que aconteceu ontem (26) em São Paulo.
O resultado foi a criação do Grupo de Trabalho Fornecedores Indiretos na Pecuária Sustentável. Segundo Pedro Burnier, gerente do Programa de Cadeias de Pecuária da Amigos da Terra – Amazônia Brasileira “o evento foi pra oficializar a criação desse grupo e acho que nós conseguimos isso, representantes dos principais elos da cadeia produtiva estiveram aqui”.
O objetivo do grupo será alinhar políticas já existentes e discutir ferramentas para o controle da carne. Durante o evento foram relatadas experiências já existentes e reforçada a diferença entre monitoramento e rastreabilidade, para que sejam fortalecidas as ferramentas já existentes.
Caso do Pará
Luciano Guedes esteve representando o governo do Pará e a Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará (Adepará) que trabalharam na aprovação de uma norma que exige a necessidade do Cadastro Ambiental Rural (CAR) das propriedades rurais para emissão do Guia de Trânsito Animal (GTA). A medida que parece simples, é na verdade bastante inovadora por reunir e cruzar informações de diferentes ferramentas.
Guedes que já foi produtor afirma que antes de entender completamente o assunto possuía receio com a temática. “Eu como todo produtor no inicio tinha também resistência quanto ao entendimento da importância de uma medida dessa natureza”, afirma. Mas garante que pra quem já cumpre a lei é um trabalho de somente colocar no papel.
O objetivo da iniciativa é também transformar a imagem que dos produtores, geralmente taxados de desmatadores. “Nós vamos provar para o Brasil e para o mundo que nós produzimos de forma sustentável ambientalmente, respeitamos a legislação trabalhista e evidentemente temos viabilidade econômica”, afirma.
A medida já está valendo desde o dia 15 de fevereiro e é obrigatória, nesta primeira etapa, apenas os produtores com rebanho acima de mil animais. Caso a propriedade não esteja cadastrada ou o CAR não esteja válido, o responsável terá que procurar a Semas, para regularizar sua situação.
“Toda mudança tem resistências, mas essa adequação – que na verdade não é uma mudança – é para o bem da cadeia produtiva da pecuária no Estado do Pará.”, afirma.
Monitoramento
Parte das exigências de maior controle na cadeia produtiva surgiu graças ao monitoramento da floresta Amazônia. Em junho de 2009 foram ajuizadas uma série de ações que pediam indenização por danos ambientais causados pela criação irregular de gado no Pará. Nos meses seguintes outros problemas foram denunciados resultando na assinatura de um Termo de Ajuste de Conduta (TACs) do MPF om frigoríficos, curtumes e empresas calçadistas, que se comprometeram com exigências ambientais e sociais dos seus fornecedores.
Foi criado o projeto Carne Legal, organizado pelo Grupo de Trabalho Amazônia Legal, que tinha como foco a redução do desmatamento. A iniciativa se estendeu para os outros estados da Amazônia Legal. Organizações, como a Amigos da Terra, também contribuíram com o lançamento de pesquisas e documentos que revelavam a situação da carne no Brasil.
Ouça a opinião do Paulo Barreto, pesquisador do Imazon:
Mercado e crédito
Existem 49 segmentos industriais diferentes no setor ‘bovino’: couro, ossos, vísceras, entre outros. Em 2010, esses segmentos movimentaram 168 bilhões de dólares. Só em janeiro deste ano as exportações de carne atingiram faturamento de US$ 375 milhões, segundo dados divulgados pela Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (ABIEC).
A demanda pela origem e controle dos alimentos tem crescido, segundo Burnier “existe uma exigência do mercado querendo um maior controle, um maior acompanhamento dos fornecedores indiretos”. A falta de um sistema confiável de monitoramento para fornecedores indiretos restringe o potencial de acesso ao mercado internacional.
Representando o Banco do Brasil Albano Silva da Conceição ressaltou que o crédito é um indutor da legalidade. Propriedades irregulares ficam com restrições que impossibilitam a aquisição de crédito para seus negócios. Conceição ressaltou que é importante que os mecanismos de controle sejam melhorados para evitar fraudes.
O QUE É:
CAR
O Cadastro Ambiental Rural é um registro georreferencial obrigatório para todos os imóveis rurais do país. Contém informações e delimitação de Áreas de Proteção Permanente (APP), Reserva Legal (RL) entre outras com o objetivo de fornecer um diagnostico ambiental. Caso esteja irregular o produtor pode se cadastrar no Programa de Regularização Ambiental (PRA).
Quem não se cadastrar até o dia 5 de maio terá sua propriedade considerado como irregular.
GTA
Guia de Trânsito Animal é o documento oficial para trânsito dos animais e deve conter informações das condições sanitárias e a finalidade do transporte.
SIF
O Serviço de Inspeção Federal é de responsabilidade do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e comprova as condições sanitárias e tecnológicas para dos de origem animal comestíveis e não comestíveis. Ele é utilizado tanto no mercado interno quanto externo.
Monitoramento
Existem ferramentas que monitoram as propriedades. O MPT atualiza uma lista de empresas que utilizam de mão de obra análoga à escravidão, o Ibama disponibiliza dados sobre áreas com restrições ambientais e o INPE e o IMAZON monitoram o desmatamento das propriedades que estão no bioma Amazônia para identificar o desmatamento ilegal.
O Evento
Burnier explica comenta o evento e explica o que são fornecedores indiretos. Assista:
Com mediação de Samuel Giordano, da Pensa USP (Centro de Conhecimento em Agronegócios), o evento foi organizado pela Amigos da Terra – Amazônia Brasileira e National WildFire Federation com o apoio da Gordon And Betty Moore Fundation. Clique aqui para saber como começou.
Fonte: Amazônia.org