Projeto desenvolvido por universidades mineiras propõe reaproveitamento de resíduos de frituras para produzir combustível de baixo custo. Empresas já demonstram interesse em aplicações Já pensou em aplicar o óleo que você usa na cozinha no tanque da sua picape, SUV, caminhão ou ônibus movido a diesel? No que depender de pesquisadores mineiros, essa ideia poderá ser colocada em prática num futuro bem próximo. Projeto desenvolvido pelas universidades de Itaúna (UI) e Federal de Minas Gerais (UFMG) propõe o reaproveitamento de óleos e gorduras residuais para produzir biodiesel. A ideia, nascida em 2008 com a primeira usina móvel de biodiesel do mundo, ganhou corpo com a fusão de processos mecânicos e químicos de produção que a tornaram viável. Como consequência, quatro patentes foram registradas. Duas grandes empresas já se mostram interessadas e uma startup foi criada com foco no desenvolvimento da tecnologia.
São várias as vantagens do biodiesel de óleo de fritura (sim, aquele que usamos em casa) em relação ao diesel de petróleo: renovável e isento de enxofre, esse biodiesel pode ser usado em motores diesel sem necessidade de adaptação dos veículos. Além disso, apresenta maior lubrificamento, acarretando maior vida útil do motor, e polui 80% menos na emissão de gases de efeito estufa, aponta o coordenador do projeto Bchem – Novas tecnologias para a produção mais eficiente de biodiesel, o engenheiro mecânico Alex Nogueira Brasil.
Quando se fala em biodiesel produzido a partir do óleo de fritura, o pesquisador lembra também que o resíduo da cozinha deixa de ser descartado no meio ambiente. Apenas no Brasil, são gerados cerca de 5,5 bilhões de litros de óleo de fritura por mês. Menos de 5% desse resíduo é reciclado ou tem destinação ambiental correta. E o mais grave: um litro de óleo pode contaminar até 25 mil litros de água potável, dados alarmantes que apontam a importância do desenvolvimento de estudos como esse.
O mercado de biodiesel atual já oferece processamento de óleos vegetais naturais para produção em grande escala. Mas não aproveita matéria-prima de baixo valor agregado, como os óleos residuais do processo de fritura de alimentos, salienta Alex Brasil. “As tecnologias usadas atualmente não permitem a utilização de óleos de baixa qualidade, como os de fritura e gordura animal. O biodiesel é produzido geralmente com óleo refinado de soja. Começamos a nos perguntar se era possível trabalhar com resíduos. Partimos para a execução do projeto, feito em parceria com a UFMG”, conta o engenheiro mecânico.
Durante a fase de desenvolvimento, a Universidade de Itaúna entrou com o reator ultrassônico que transforma biodiesel (processo mecânico), enquanto a equipe liderada pelo professor Rochel Montero Lago, do Grupo de Tecnologias Ambientais da UFMG, desenvolveu novos catalisadores para trabalhar com o óleo de maior acidez (processo químico). Participam dos trabalhos alunos dos cursos de graduação de engenharia mecânica, engenharia de produção e engenharia civil.
A primeira fase, ainda anterior à participação da UFMG, foi marcada pela identificação do problema e início do desenvolvimento da tecnologia. Com investimento do grupo minerador Minerita, sediado em Itaúna, Região Centro-Oeste de Minas Gerais, foi lançada em 2008 a primeira usina móvel de biodiesel do mundo, com capacidade para produzir 30 mil litros/mês. A usina rodou mais de 20 mil quilômetros no Brasil, participando de congressos, feiras e eventos. Durante a etapa, destinou todo o biodiesel produzido para o abastecimento dos caminhões e ônibus que transportam os funcionários da mineração.
PRODUÇÃO
A parceria firmada entre as universidades promoveu uma fusão de tecnologia na produção de biodiesel por irradiação ultrassônica com catalisadores heterogêneos nano modificados. A aplicação está inserida no desenvolvimento da tecnologia – usina e processo -, com ênfase em um processo de elevada sustentabilidade técnico-econômico-ambiental, permitindo o uso de matérias-primas de baixo valor agregado. O trabalho de pesquisa e inovação tecnológica já rendeu ao grupo o depósito de quatro patentes no Brasil e nos Estados Unidos: reator ultrassônico, usina de biodiesel, processo produtivo e catalisador heterogêneo.
Em dezembro, o trabalho foi o primeiro colocado da 3ª Feira de Ciências e Inovações Tecnológicas (Feicintec) promovida pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG). “Hoje, temos tecnologia certificada para produção de biodiesel em pequena escala, a um baixo custo que permite transformar matéria-prima de baixa qualidade, principalmente óleo de fritura de alimentos, em biodiesel que atenda às especificações legais”, garante Alex Brasil. Além da Minerita, o projeto conta com a participação da rede de supermercados Verdemar, de Belo Horizonte, e aguarda definição para uso do biodiesel na fábrica da Fiat Automóveis S/A, em Betim, com extensão para alunos da PUC Minas. De acordo com a Fiat, para confirmar o projeto oficialmente faltam apenas conversas formais. Mas busca novos parceiros, como empresas de transporte de cargas e de passageiros, cujo diesel é uma das principais fontes de custos de operação.
DESENVOLVIMENTO
Alex Brasil destaca ainda a importância da participação dos estudantes no desenvolvimento e apresentação dos trabalhos. “A universidade é o momento de experimentar, de mostrar aquilo de que são capazes, criando tecnologia e ferramentas que representem avanços palpáveis e sirvam à população em geral.” Depois de participar e vencer competições de empreendedorismo, Alex Brasil, Rochel Lago e André Brasil decidiram criar a startup Bchem Solutions, como foco de trabalho na área. Os pesquisadores agora aguardam a certificação do combustível junto à Agência Nacional do Petróleo. Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Fonte: O Estado de Minas