Produção sustentável reduz custo das empresas, dizem executivos
O financiamento anual necessário para a transição das empresas para a economia verde gira entre US$1 trilhão e US$2,5 trilhões por ano, entre investimentos em infraestrutura e bens e serviços. O cálculo está no relatório “O argumento comercial para a economia verde: retorno sustentável do investimento”, divulgado no fim de semana durante a Rio+20. Mesmo com a crise mundial, no entanto, a necessidade de gastar dinheiro na sustentabilidade já entrou na agenda das empresas. A maioria dos executivos ouvidos pelo Valor prevê, inclusive, que a produção sustentável pode ajudar a reduzir custos. Ao mesmo tempo, a iniciativa privada parece ficar com o sentimento de que ainda é preciso coragem para investir em economia verde.
Para Mark Lee, diretor da SustainAbility, empresa americana que trabalhou com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (Pnuma) na elaboração do relatório, o desafio é possível mesmo com a crise econômica. “Se financiarmos novas tecnologias em lugar dos combustíveis fósseis podemos chegar lá”, afirma. A mudança de hábitos nas empresas já começou. A fabricante de artigos esportivos Puma incluiu o valor do impacto ambiental no balanço desde 2010. Naquele ano, o impacto ambiental foi negativo, em 145 milhões de euros.
Mas é preciso analisar o que ainda falta fazer. “Nós, da indústria de seguros, ainda não concluímos um plano para saber como a nossa atividade pode montar uma equipe que estude as mudanças climáticas. Mas esse é um sonho que temos para o futuro. Queremos estudar essas catástrofes. É importante que se traga para essa discussão as universidades”, diz Eugênio Velasques, diretor executivo da Bradesco Seguros.
A crise mundial aparece em todas as conversas dos executivos na Rio+20. Mas todos apontam para alguma solução. Para Luiz Carlos Angelotti, diretor de relações com investidores do Bradesco, a crise é um problema atual do planeta. “A questão da sustentabilidade é de mais longo prazo e é importante todos os países estarem envolvidos e contribuírem da melhor maneira possível”.=, diz. “Poder falar de sustentabilidade em larga escala, perto da população, é hoje o mais importante”, destaca Velasques.
O envolvimento da cadeia de fornecedores é um dos maiores desafios para as empresas. “O maior impacto ambiental acontece mais longe, na cadeia de fornecedores”, diz o presidente da Puma, Jochen Zeitz. Na Siemens, 10% dos cerca de 9 mil fornecedores participam de campanha para produção com menor impacto.
Na Procter & Gamble, o desafio é ainda maior. São 75 mil fornecedores. A empresa trabalha com um sistema de pontuação para definir e premiar as empresas das quais vai comprar. “A sustentabilidade tem grande peso nesse cálculo”, afirma o vice- presidente mundial de sustentabilidade, Peter White.
Os executivos engajados na causa ambiental asseguram que no longo prazo, gastar dinheiro com uma manufatura mais sustentável pode, ao contrário do que parece, trazer economias faturas para as empresas. E até aumentar o volume de vendas. “Se reduzimos o tamanho da embalagem do amaciante já economizamos e se conseguimos fabricar um sabão em pó que usa menos água podemos atrair mais consumidores, aqueles com mais dificuldades para ter acesso à água”, diz White.
As empresas sabem que há um longo caminho a percorrer na mudança de hábitos do consumidor, principalmente nos países ricos. Pesquisa da Procter & Gamble indicou que somente 15% dos clientes aceitam pagar mais por um produto elaborado de forma sustentável.
“Os consumidores estão perdidos. Eles recebem dezenas de informações e propagandas sobre o que fazer, dizendo compre isso ou faça aquilo”, afirma Colin Calder – diretor da PassivSystens, empresa que desenvolve soluções para reduzir a emissão de carbono nas residências e nas empresas. “Eles não sabem o que comprar, como fazer para o aquecimento seja mais eficiente ou como reduzir seu consumo de energia”, completa. “São os produtos que vão mudar o comportamento do consumidor, diz Hàkan Nordkvist, diretor de sustentabilidade e inovação da Ikea. “O cliente não poderá mais decidir entre preço, conforto e sustentabilidade”, afirma.
Nas regiões emergentes, o processo será mais fácil, acreditam os executivos. Sempre que viaja para algum dos países onde a Unilever vende seus produtos, Paul Polman, principal executivo da multinacional anglo-holandesa gosta não apenas de percorrer as prateleiras das lojas como visitar a casa dos próprios consumidores. Há poucos dias, em passagem pela índia, chamou sua atenção a revelação de um consumidor. Ele lhe contou que frequentemente é obrigado a escolher entre lavar os cabelos ou a roupa porque a água disponível na área onde ele mora é insuficiente para as duas coisas. A informação do indiano já seria suficiente para o executivo que dirige a companhia que vende tanto xampu quanto sabão em pó perceber que se as condições de vida e consumo da população mundial não mudarem todos vão perder.
Já faz tempo que Polman, da Unilever, propõe que a relação das empresas com os acionistas se volte para a sustentabilidade. “A questão não é mais perguntar por que temos que fazer isso, mas sim o que acontecerá se não fizermos”, afirma, numa referência à clássica pergunta que muitos fazem sobre o efetivo interesse dos investidores de aplicar o dinheiro numa atividade que preza sustentabilidade, principalmente em épocas de crise como a que vive hoje a Europa.
O manifesto que o executivo trouxe para o Rio destaca a necessidade de união de esforços entre empresas em governos. Mas isso é possível mesmo entre empresas competidoras? “Nós podemos ter ações conjuntas, como a unificação do código de barras e continuar concorrentes em outras ações”, afirma. “O uso racional de caminhões, em conjunto com a cadeia de fornecedores, pode ser uma ideia, lembrando que muitas vezes se descarregam produtos de uma empresa e o caminhão volta pelas estradas vazio”, completa. “O que todos têm de ter em mente é que o negócio não vai prosperar se os hábitos não mudarem porque se não houver mais peixe no oceano ninguém vai pescar”. (Colaboraram Martha Nogueira e Paola de Moura)
Fonte: Valor Econômico
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